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sábado, 13 de julho de 2013

Poetas da Nossa Terra

Anrique Passo D'arcos





ALÉM DA MORTE

Fecho os olhos num sonho que me leva
Às paragens divinas da saudade,
Lá onde a noite é apenas claridade
Dando origem talvez a nova treva.
Fecho os olhos e avisto a Eternidade,
Lá onde um sol fantástico se eleva
Num perpétuo fulgor, sem que descreva
Sua órbita de luz na imensidade.
Fecho os olhos e vejo a minha imagem
Anoitecendo os longes da paisagem,
Como a única sombra que persiste...
Sou eu! sou eu aquele vulto errando!
Sou eu, além da morte ainda sonhando
Na tua graça e neste amor tão triste!...


O peregrino da noite Anrique Paço d' Arcos (1906-1993) 

terça-feira, 9 de julho de 2013

Poetas da Nossa Terra



És  Linda


És linda. E nem sabes quantos pedaços de beleza tive de juntar para chegar a esta conclusão. Para te construir, tive de misturar a conspiração das searas com a tristeza do choupo, a inquietação da cotovia com o cheiro lavado do vento do ocidente. E a firmeza repartida dos livros, com a alegria explosiva dos miosótis e a luz escura das violetas. Juntei depois um pouco de ansiedade das estrelas, a paciência das casas à beira da falésia, a espuma da terra, o respirar do sul, as perguntas de gesso que se fazem à lua. Acrescentei-lhe a canção das margens e pequenos pedaços da angústia do olhar. Não esqueci a intimidade do frio nem a dor branca que habita o coração dos muros. Por fim, deitei na tua pele o sono dos alperces, aos teus músculos prometi a violência das cascatas, no teu sexo acordei a memória do universo.
A tua beleza está no meu desejo, nos meus olhos, na minha desigual maneira de te amar. És linda, repito. Mas tenta não encarar o que te digo como um elogio.

Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'